Hoje trago aqui, na integra, o texto publicado no Jornal As Beiras, em 13/02/2011 e assinado pelo actual Secretário de Estado da Administração Local e Reforma Administrativa, na altura Presidente da Câmara Municipal de Penela.
Vejam como é simples, para alguns, mudar de opinião dependendo do lado em que se encontram:
Presidente da Câmara
Municipal de Penela
Faz sentido reflectirmos sobre o modelo de desenvolvimento
de território que queremos em Portugal. Desde há 40 ou 50 anos, aldeias e vilas
foram ficando mais vazias, os campos agrícolas abandonados, as florestas mal
cuidadas e mais vulneráveis ao flagelo dos incêndios florestais, tudo porque
verdadeiramente, ali, nessas partes de Portugal, não havia oportunidades nem as
condições mínimas de dignidade para existir futuro.
Algumas décadas passaram e, sobretudo após Abril de 1974,
com a autonomia do poder local, com a vontade e empenho dos que ainda por lá
resistiram ficar, construiu-se um Portugal novo, é certo, com alguns erros, mas
com escolas, equipamentos culturais e desportivos, requalificações urbanas que
permitiram devolver a dignidade e criar alguma coesão territorial, afinal,
porque somos todos portugueses.
Apesar disso, as florestas continuam mal cuidadas, os campos
ainda à espera de serem novamente desafiados a produzir, as aldeias
envelhecidas e as vilas mais bonitas à procura do seu novo futuro.
Faltam pessoas, na grande parte destes concelhos de
Portugal. Como faltam pessoas, faltam dinâmicas sociais, o que invariavelmente
provoca falta de oportunidades de emprego, que por sua vez obriga a que os
jovens procurem outros destinos mais desafiantes e, fecha-se assim, este ciclo
vicioso.
Num tempo de elevada competitividade, ao qual se junta a
nossa crise económica e financeira, e muito desvario governativo, com parcos
recursos, a força dos indicadores ganha expressão e tende a submeter as
estratégias de desenvolvimento a um plano secundário. Surgem assim, os indicadores
per capita e, mais uma vez, aquelas partes de Portugal, que apesar de estreito,
tem ironicamente um enorme Interior, tendem a sair ainda mais prejudicadas.
Uns dizem que o melhor é cortar umas freguesias, como se
estes territórios fossem comparáveis ao concelho de Lisboa. Outros pensam que a
solução para o desperdício será cortar o número de municípios. Claro, os mais
pequenos, aqueles que têm menos gente, como se não soubessem que é precisamente
aí que os municípios têm um papel essencial no desenvolvimento e na coesão – na
grande parte destas Terras, se não fossem os municípios, não haveria um Euro de
investimento público.
E nesta escalada de demagogia e de desconhecimento de como é
este Portugal fora dos grandes centros urbanos, ouvimos os mesmos de sempre, em
estado aparente de esquizofrenia, ao mesmo tempo a dizer que temos de valorizar
a floresta, a agricultura e o património, a apelar à diminuição de municípios
em nome do superior interesse do défice.
Para que conste, a dívida total de todos os municípios em
Portugal é menor do que a dívida da REFER, da CP e do Metro de Lisboa! Por
outro lado, os municípios contribuíram, ao contrário do Governo, para a
consolidação orçamental em 2009 e 2010, fazendo com 10% das receitas do Estado,
cerca de 50% do investimento público.
É evidente que faz sentido discutir e redefinir as
competências de escala municipal, eventualmente acabar com muitas empresas
municipais porque, algumas delas, não servem para quase nada e gerir de forma
mais eficiente os recursos, porventura, adequando melhor os desejos à
realidade, tornando sustentável a gestão financeira.
É claro que os municípios terão que assumir uma nova agenda,
e reforçar o seu papel em áreas como a educação, o empreendedorismo e a
inovação, entre outras.
Mas tão importante, é saber qual é futuro que queremos para
o território e o modo como o pretendemos desenvolver, sabendo que um dos
principais temas mundiais, são as alterações climáticas e que 70% das suas
causas têm origem no transporte de bens e pessoas para as grandes cidades ou
que os custos da solidariedade social e a degradação da vida humana ganham
escala nas grandes metrópoles.
Quando se fala do Interior, é isto que deve ser reflectido.
As redes de fibra óptica são, reconhecidamente, um importante passo para o
desenvolvimento, mas de nada servirão se o ciclo vicioso não se quebrar e, para
isso, é preciso termos uma estratégia para a floresta, para a agricultura, para
o desenvolvimento económico e atracção de empresas e, sobretudo, perceber que a
gestão territorial de qualquer município do Interior, com centenas de
quilómetros quadrados e dezenas de aldeias ainda ocupadas por portugueses, é
bem mais complexa do que a freguesia do Lumiar, ainda que esta, possua mais
habitantes.
É disso que falo. O grande debate público que deveria ser
lançado, sem preconceitos, por um Governo responsável deveria ser: Qual é a
estratégia de desenvolvimento e de coesão para o Interior de Portugal?
Normalmente quem começa a casa pelo telhado, tem fracos
resultados e, mais uma vez, quem perde é Portugal!